Os estivadores , o Belenenses e uma misteriosa «poção mágica»: o Gaiteiro

O Sr. Silvino é o proprietário d’O Gaiteiro, um dos restaurantes populares de Lisboa que resiste incólume o fantasma da gentrificação. Acolhe-nos no local, dirigido atualmente pela filha, com hospitalidade e humor minhotos. Filho orgulhoso de Ponte da Barca, explica-nos a origem do negócio à vez que nos mostra um quadro que representa um gaiteiro na sua vila natal. O nome do restaurante foi ideia dele, mas a figura do músico é, ao mesmo tempo, uma homenagem à sua terra natal e ao antigo proprietário: o galego Manuel Esteves. Galegos e minhotos misturavam-se e sucediam-se na gerência das tascas de Lisboa, como aconteceu neste caso quando o Sr. Silvino decidiu assumir o comando da taverna, após a morte do patrão.

Vídeo: David Fontán Bestilleiro

Os Navy Bar do Cais do Sodré

Como no poema de Manuel António, a gente do mar naufragava todas as noites nas tascas do Cais do Sodré. Os estivadores galegos eram uma parte fundamental desta procissão das almas e a baiuca do Sr. Manuel era o destino favorito de muitos deles, mas não era por acaso. O velho galego soube criar uma bebida única, um produto exclusivo cuja fórmula secreta se perdeu com a morte do druida. Não sabemos como prepará-la, mas a partir do nome, precisamente «O Gaiteiro», podemos imaginar que os seus os efeitos nos rijos estivadores oscilavam entre a euforia e a ressaca. Será para sempre uma incógnita se o «gaiteiro» teria a possibilidade de rivalizar hoje com a Ginja e o Eduardino pela posição mais elevada do panteão dos licores lisboetas.

Quando na Bica eram do Belenenses

Os estivadores e outros galegos da Bica não íam ao Gaiteiro apenas para beber. Existia um outro compromisso mensal, a meio caminho entre o lúdico e o religioso: pagar as quotas do Belenenses. O próprio Sr. Silvino conta-nos como extendiam um cordel no local e penduravam dele as contribuições dos sócios para o clube. O próprio filho do Sr. Manuel, José Esteves, era o responsável por entregar a arrecadação e recebeu o emblema de ouro do clube, que gostava de levar à vista sempre que vestia «o fatinho».

Restaurante O Gaiteiro | Rua de S. Paulo, 214